Presença da Pastoral da Ecologia Integral (PEI) na Igreja
Sempre é bom lembrar que para a Igreja Católica omissão é pecado, e no caso da omissão diante da destruição das obras da criação e do agravamento da crise socioambiental, um pecado ecológico.
Por Juacy da Silva
"A justiça ambiental – implicitamente anunciada pelos profetas – já não pode ser considerada um conceito abstrato ou um objetivo distante. Ela representa uma necessidade urgente que ultrapassa a mera proteção do ambiente. Trata-se verdadeiramente de uma questão de justiça social, econômica e antropológica. Para os que creem em Deus, além disso, é uma exigência teológica, que para os cristãos tem o rosto de Jesus Cristo, em quem tudo foi criado e redimido. Num mundo onde os mais frágeis são os primeiros a sofrer os efeitos devastadores das alterações climáticas, do desflorestamento e da poluição, cuidar da criação torna-se uma questão de fé e de humanidade. Chegou verdadeiramente o tempo de dar seguimento às palavras com obras concretas, vivendo a vocação de guardiões da obra de Deus para que as sementes de justiça possam germinar, contribuindo para a paz e a esperança". Papa Leão XIV
Para a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) “pastoral é uma ação ou conjunto de atividades que a Igreja Católica realiza para cumprir sua missão de continuar a obra de Jesus Cristo, abrangendo diferentes grupos e realidades. Ela envolve a evangelização e o anúncio do Evangelho por meio de serviço, diálogo e testemunho”.
Neste sentido, as pastorais são formas concretas de evangelização (através de ações sociotransformadoras e de mobilização profética), adaptadas às diversas realidades e necessidades da sociedade e, assim, as pastorais sociais, inseridas na dimensão sociotransformadora, em particular, buscam promover a justiça social, a caridade e a paz, atuando em áreas como a defesa dos direitos humanos, da assistência aos mais vulneráveis, a promoção da dignidade humana, combatendo as desigualdades, os preconceitos, o racismo e, também, a defesa da ecologia integral.
Diálogo com a sociedade
A ação pastoral busca o diálogo com a sociedade procurando construir pontos e parcerias tanto internamente na Igreja quanto com movimentos e organizações populares e organismos públicos, para responder aos desafios contemporâneos, incluindo os desafios socioambientais, entre os quais não podemos esquecer de destacar a grave crise climática que estamos vivenciando nos últimos anos e décadas e construir um mundo mais justo, fraterno, inclusivo, de paz e sustentável com mais equidade e menos desigualdade social e violência.
O mundo todo, inclusive o Brasil enfrenta inúmeros desafios socioambientais, como a destruição da biodiversidade, a poluição dos solos, das águas, do ar, o desmatamento, a destruição de nascentes e outros mais que culminam com a crise climática e suas terríveis consequências tanto em relação à natureza, quanto em relação às pessoas e sistemas produtivos; mudanças essas que se não forem interrompidas ou mitigadas a tempo podem colocar em risco a própria sobrevivência de todos os tipos de vida no planeta, inclusive a vida humana.
Diante disso, não foi por acaso que o Papa Francisco em 24 de maio de 2015 publicou a Encíclica Laudato Si (sobre a Ecologia Integral e o cuidado com a Casa Comum), mesmo ano em que a ONU estabeleceu os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e, durante a realização da COP 21 foi firmado o Acordo de Paris, ano considerado emblemático, diante da gravidade da crise socioambiental planetária.
Novamente em 12 de outubro de 2023, o Papa Francisco escreveu a Exortação Apostólica Laudate Deum, endereçada não apenas aos participantes da COP 28 que foi realizada naquele ano, mas também a todos os cristãos (católicos e evangélicos) e não-cristãos, enfatizando que apesar de naquele ano já terem se completados oito anos da publicação da Laudato Si, pouco havia sido feito, em termos concretos, diante de vários indicadores estabelecidos na Agenda 2030, para enfrentar de forma efetiva a mudança/crise climática e seus efeitos deletérios.
Neste ano de 2025, novamente a Igreja particular, no caso a Igreja do Brasil escolheu o tema da Ecologia Integral para ser o Lema da Campanha da Fraternidade, (dando sequência a outras oito campanhas anteriores que também dialogaram com temas ecológicos).
Todavia, quando nos debruçamos sobre a situação socioambiental do Brasil e do Planeta, na Etapa do método da Igreja – VER – constatamos que poucos avanços têm sido feitos e a degradação dos biomas, dos ecossistemas continuam a todo vapor, tanto no Brasil quanto no resto do mundo, razão pela qual a Igreja enquanto um todo no país não pode se OMITIR diante dos desafios.
Pecado ecológico
Sempre é bom lembrar que para a Igreja Católica omissão é pecado, e no caso da omissão diante da destruição das obras da criação e do agravamento da crise socioambiental é um pecado ecológico, o que para a sociedade civil é crime ambiental.
Assim, cremos que uma das formas ou a melhor forma da Igreja se posicionar de maneira efetiva, permanente, com ações sociotransformadoras e mobilização profética, buscando tanto a conversão ecológica – individual e comunitária, bem como a mudança de paradigmas de uma economia da morte por outros e novos paradigmas que possibilitem o florescimento da economia da vida, como nos exortava o Papa Francisco ao falar e propor a "Economia de Francisco e Clara", como um novo modelo de economia, isto tudo poderia ser realizado através das ações e atividades da Pastoral da Ecologia Integral, devidamente apoiada e articulada nacionalmente pela CNBB; o que atualmente ainda, inexplicavelmente, não existe.
Todavia, apesar desses dez anos de Laudato Si e dois anos de Laudate Deum, a presença da Pastoral da Ecologia Integral na Igreja no Brasil ainda é bastante insignificante, considerando que existem no país 48 arquidioceses; 217 dioceses, sete prelazias; mais de 12 mil paróquias, mais de 180 mil comunidades eclesiais (de base); mais de 320 bispos e arcebispos, aproximadamente 30 mil padres (sacerdotes, vigários e párocos), além de aproximadamente mais de 30 mil irmãs de vida consagrada e, em torno de 120 milhões de pessoas que se consideram católicas, ou seja, 56,7% da população total do Brasil, conforme o último Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2022.
Convenhamos, a Igreja Católica tem ou poderia ter um peso considerável em todas as dimensões da vida nacional e em relação ao que poderia estar fazendo no combate à degradação dos Biomas, dos Ecossistemas e por um melhor cuidado com as Obras da Criação poderia ser algo extremamente grandioso.
Mas para tal é fundamental que além de palavras e exortações é necessário que passemos às ações sociotransformadoras e muita mobilização profética e tudo isso pode ser realizado pela Pastoral da Ecologia Integral, desde que a mesma esteja presente em todos os territórios eclesiásticos mencionados e também conte com o apoio e orientação (espiritualidade ecológica) da hierarquia eclesiástica e também a participação de dezenas de milhares de Leigos e Leigas engajados e engajadas na vida e caminhada pastoral, em defesa da Ecologia Integral.
Promoção de diálogo
No dia 19 de agosto de 2025, ocorreu, de forma virtual, uma reunião entre a Comissão de Ecologia Integral e Mineração da CNBB, três Bispos Diocesanos Referenciais da PEI – Regionais da CNBB Leste 1; Sul 1 e Sul 2 e quatro integrantes da Coordenação Geral da Pastoral da Ecologia Integral do Brasil (APEIBR).
O objetivo da reunião foi a promoção de um diálogo tendo em vista situar a PEI no contexto das ações pastorais sociotransfrormadoras e de mobilização profética da Igreja, no maior número de arquidioceses, dioceses, paróquias e Comunidades Eclesiais no Brasil como um todo.
Constata-se que a organização da PEI tem sido muito mais resultado de um esforço de um grupo cada vez maior de Leigos e Leigas engajados e que tem abraçado a luta em defesa da Casa Comum, da Ecologia Integral, a partir da realidade socioambiental de cada território eclesiástico considerado.
Constata-se que apesar deste esforço enorme, a Igreja, no caso a CNBB Nacional ainda não abraçou totalmente a referida Pastoral, não apenas a nível nacional, mas, na grande maioria dos Regionais da CNBB não existem bispos ou sacerdotes como referenciais e nem uma comissão regional para contribuir para um trabalho mais articulado, duradouro e profundo.
A estruturação, organização e a implantação da PEI ainda encontram certa resistência ou desinteresse tanto por parte de Leigos e Leigas quanto de integrantes do clero e das organizações de religiosos e religiosas na maior parte dos territórios eclesiais.
Constata-se ainda a falta de uma consciência em relação à gravidade da crise socioambiental, principalmente da crise climática e de todas as formas de degradação dos biomas e ecossistemas, razão pela qual um ou talvez o maior desafio seja a conversão ecológica dentro da própria Igreja, tanto na dimensão individual quanto comunitária, como tanto nos exortava o Papa Francisco, além do negacionismo ecológico de amplos setores da sociedade brasileira, principalmente dos que ainda lucram com esta destruição da natureza.
Diante disso, conforme pode-se perceber da memória daquela reunião, existem inúmeros desafios que precisamos enfrentar para que a Igreja, como um todo no Brasil possa realizar um trabalho de forma mais orgânica e institucional e não apenas através de um esforço quase que marginal às ações planejadas de cada arquidiocese, diocese, paróquia ou comunidade, como vem acontecendo.
Naquela reunião presencial foi pontuada a importância do Tema da Campanha da Fraternidade de 2025 (Fraternidade e Ecologia Integral), das celebrações dos dez anos da publicação da Encíclica Laudato Si, dos 800 anos das celebrações do Cântico das Criaturas e da realização da COP 30 em Belém no final deste ano de 2025.
Todos esses eventos e celebrações foram considerados momentos significativos para a expansão dos trabalhos da PEI e a possibilidade de organização/estruturação da mesma em um maior número de territórios eclesiásticos, o que, lamentavelmente, não tem ocorrido como esperado, razão pela qual os integrantes do Conselho Nacional e da Comissão Executiva da Articulação Nacional da PEI do Brasil voltaram a buscar um diálogo mais formal.
Oxalá a Igreja no Brasil possa "avançar para águas mais profundas" e abraçar de vez e com determinação o desafio de realmente defender através de ações sociotransformadoras e de mobilização profética, a causa da Ecologia Integral e possamos promover mudanças de hábitos, costumes e de estruturas produtivas, seguindo os ensinamentos dos papas Francisco e Leão XIV.
É neste contexto que esperamos a Pastoral da Ecologia Integral possa inserir-se de fato no esforço da CNBB de sermos "o sal da terra e a luz do mundo" quando se fala em defesa da Ecologia Integral.
*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista e articulador da Pastoral da Ecologia Integral – Região Centro Oeste.